das fraldas

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The Cholmondeley sisters and their swaddled babies, circa 1600-1610.

Ao terceiro bebé rendi-me à s fraldas de pano*. Entretida entre absorventes, capas e musselinas, claro que me pus a pensar nas fraldas antes do plástico e nas fraldas antes das fraldas. Como se mantinham (minimamente) secos os bebés de colo europeus antes do plástico?

Coeiros. Panos de lãa usados, em que se envolvem as crianças. Costumão fazerse de cousa usada, por serem mais brandos, e naõ fazerem mal à  criança, principalmente os da primeira pensadura.
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Coeiros. São huns bocados de Baeta, ou cousa semelhante, com que se envolve o corpo da criança, para o ter quente.

Pensadura. O cueiro, & outras cousas com que se pensa huma criança.

Pensar a criança. Alimpalla, enfayxalla, darlhe mama, finalmente ter cuydado della.

Raphael Bluteau, Vocabulario Portuguez & Latino, 1728.

No tempo de Bluteau, fralda (ou falda) era a parte da camisa que ficava abaixo da cintura. Os bebés usavam cueiros e os cueiros não eram bem o mesmo que agora (ainda que agora já poucos saibam o que são: uma espécie de camisa muito simples até aos pés, sem mangas e aberta de cima a baixo com um cinto ou botões na cintura, que se veste – ou vestia – aos bebés mais pequeninos). Estes cueiros em que se envolviam os bebés no tempo de Bluteau, provavelmente em várias camadas, eram tecidos de lã já usada: de lã porque nenhum outro tecido absorve tanta humidade e se mantém quente depois de molhado, e de lã usada, certamente reaproveitada, para serem mais macios.

Diane de Poitiers
Francois Clouet, Diane de Poitiers, 1571.

Sem molas, elásticos, velcros e provavelmente também sem alfinetes, estes cueiros eram mantidos no sítio através da prática de enfaixar os bebés (swaddling), fosse com uma faixa comprida ou com um quadrado de pano dobrado com um preceito próprio. Aquilo a que hoje chamamos fralda não se distinguia da roupa dos bebés pequeninos: ao conjunto de panos em que o bebé era embrulhado chamava-se, segundo Bluteau, pensadura.

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Retrato de Luís XIV (1638-1715) em bebé, circa 1638.

The Holy Family
Francisco de Zurbaran (1598-1664), A Sagrada Família, 1659.

Bebés diferentes tinham pensaduras diferentes, naturalmente. Mas como seria a muda? Quantas horas passariam molhados e como se impedia que assassem, como se fazia para que à  noite não molhassem a cama?

*Combinadas com algumas da Bambino Mio que nos emprestaram, temos estado a usar da marca Mita, que são feitas – e muito bem feitas – em Portugal.

Comments

4 responses to “das fraldas”

  1. Ana Silva Avatar
    Ana Silva

    Eu uso musselinas + capa e adoro! A rotina de lavagem é simples, o tempo de secagem é imbatível. Experimentei também ajustadas, mas mesmo no verão demoravam muito a secar (para a nossa rotina e espaço disponível de secagem). E não consigo deixar de pensar que são as mais ecológicas (pelo processo de produção mais simples). Beijinhos

  2. Nancy Guimarães Avatar
    Nancy Guimarães

    Post fantástico com só a Rosa Pomar sabe fazer! Adorei esta viagem ao passado das fraldas!

  3. Mariana Lemos Avatar
    Mariana Lemos

    Os paninhos onde se embrulhavam os meninos, e as meninas claro, foram, sobretudo a partir dos anos 60, totalmente condenados no Ocidente porque se consideravam formas de repressão que a geração Flower Power não estava disposta a perpetuar. A intenção era a melhor, mas os resultados aparentemente não e nos últimos anos a pediatria volta a aconselhar que se embrulhem e contenham os bebés que se sentem mais tranquilos e seguros quando estão sujeitos a uma pressão suave do que esbracejando em cólera.
    Tudo na forma como criamos as crianças está conectado – mesmo que inconscientemente – com o tipo de adulto que pretendemos “produzir”. Deixa-o chorar que enrijece, fecha a luz que se habitua a não ter medo, castiga se perdeu um brinquedo na escola são instruções para construir um ser implacável, e seguramente muito infeliz…
    Quando não existiam fraldas lembro-me de ver no campo, na cidade não claro, assim que deixava de estar frio, as crianças muito pequenas de “rabo ao léu”, pelo menos não ficavam assadas, o que segundo os últimos Pais da geração integralmente fraldas de pano constituía uma preocupação efectiva :-)

  4. Sónia Martins Avatar

    Publicação interessantíssima, adorei :) teoricamente também sou rendida à s fraldas de pano, na prática nem sempre as uso. Espero num segundo filho usar bem mais, de preferência quase sempre :p mas por enquanto ainda tenho muitos meses de fraldas com este :)

    Infelizmente na creche onde ele vai entrar agora em Setembro disseram logo que não aceitam fraldas de pano.

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