Na semana passada, junto com algumas gavetas, e outras velharias, encontrei num prédio em obras aqui ao lado uma arca cheia de trapos velhos que não resisti a abrir. Entre eles, uma manta de trapo muito velha e puída mas tão fina que tive de a trazer comigo para ver se sobrevivia a uma boa lavagem. Está rota demais para usar como tapete, mas acho que dará umas boas almofadas. Resolvi experimentar bordar-lhe um passarinho em ponto de cruz, depois de andar de volta do catálogo de uma exposição do Museu de Arte Popular sobre o tema (O ponto de cruz: a grande encruzilhada do imaginário. Coord. Elisabeth Cabral – ainda disponível na loja do Museu de Arte Antiga).
É impressionante a diferença entre as mantas de trapo antigas, feitas com roupa cortada em tiras o mais estreitas possível e debruadas a tecido, e as que se vendem agora, quase sempre de trapilho industrial e onde já não se vêem os efeitos tradicionais. As mantas de trapo, que se fazem em vários países, devem ser uma ideia com tantos séculos de vida como o próprio trapo. Duas imagens com mais de cem anos:
Mantas de Farrapos à venda no Minho em 1908 (Ilustração Portuguesa, 111, 6 de Abril de 1911).
Mantas à janela em Viana do Castelo durante a passagem do rei D. Manuel II (Ilustração Portuguesa, 145, 30 de Novembro de 1911).
maravilhoso!
Trazes sempre coisas lindas para aqui, Rosa. :)
Na Beira Alta também há dessas mantas. Eu ainda uso algumas mais estreitas e compridas como tapete na casa de banho (por ex.). São muito resistentes, muito bonitas e fazem parte das minhas raízes.
Vivo nos últimos anos em Caldas da Rainha e uma vez por ano, na procissão de Outubro (que é feita à noite) as pessoas põem colchas e mantas nas varandas, é um espectáculo lindo e a que nunca tinha assistido. Todos os anos digo que fotografo, mas com a procissão a decorrer, nunca tenho coragem.
Na minha infância, enquanto uma das minhas tias costurava os meus vestidos a outra fazia tiras de tecido dos retalhos que sobejavam. Dessas tiras nasciam enormes rolos de trapilho que levávamos a uma srª que no seu tear tecia as mantas que nos aqueciam nas noites de Inverno.
O desenho das mesmas era deixado ao critério da artesã e da sua imaginação nascia o padrão.
Isto foi….há 45 anos atrás.
é por causa de posts como este que adoro vir aqui:)
Que espanto :)
Tenho várias dessas mantas em casa que eram da minha avó materna e adoro. São os melhores tapetes :-)
Eu também tenho algumas destas mantas, herdadas da minha avó. Para mim são uma relíquia, não só pelo óbvio valor afectivo, como pela qualidade e beleza das mesmas. Quando tiver oportunidade vou fotografa-las também! :)
Tenho uma dessas mantas/tapetes cá por casa e outra ainda habita em casa dos meus pais.. estas ainda foram feitas de trapos e pela minha avó.
A minha mãe que sempre conviveu com elas não entende o meu apreço por este artigo. Mas a verdade é que, não sendo apologista de tapetes, pelo trabalho e sujidade que dão, posso confirmar que estes tapetes (como são usados cá em casa) são muito mais resistentes que os tapetes normais e práticos de se limpar.
Lembro-me de olhar para eles em pequenina e achar aquele tecido muito estranho, lembro-me de tentar descortinar a sua confecção.
Continuo a olhar para eles fazem-me lembrar a minha avó.
Casa sim, casa não, havia teares na aldeia onde vivo. As mulheres, muitas vezes em condições precárias teciam muito antes da madrugada. Adiantavam servíço para a seguir se dedicarem à agricultura e às lidas domésticas. Há quem ía à feira e os fregueses eram muitos. Traziam roupas velhas, os trapos e tinham a promessa de dentro dum mês terem a manta ou o tapete feito.
Cultivava-se o linho. Lindo era este campo! E quando não teciam as mantas de trapo, teciam lenções ou guardanapos de linho.
Hoje, procuro um tear porque ainda há uma senhora disposta a ensinar-me. Não há um em condições e muitos foram para a fogueira.
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