Sabia que os pastores iam ficar um mês e meio a dormir na Serra, mudando de lugar a cada duas ou três semanas, mas não sabia como. Já vÃramos a minúscula choupana, a que na brincadeira chamam a cabana do amor, tÃnhamos ouvido falar do frio e do mau tempo (difÃceis de imaginar numa tarde de calor como a do dia da subida) mas o que vimos surpreendeu-me. Encontrámos um enorme penedo transformado em casa. Não foi ideia dos três homens que lá estão agora usarem-no: é já conhecido dos mais velhos e julgo que ocupado todos os anos. Cada reentrância, cada encontro entre o penedo e as pedras que o rodeiam se transformam nestes dias em arrumação, em cozinha, em suporte dois em um para a antena do rádio e para o espelho que usam para fazer a barba, elemento mais surrealista de toda a instalação. Num estreito vão entre o penedo e o chão ouvi dizer que dormiram uma vez quatro homens para se abrigarem do frio. No curso de água gelado que corre ao lado lavam a louça e demolham o bacalhau que, garantem, fica só espinha se o deixarem mais do que umas horas. Para os banhos ocasionais deixam água em alguidares ao sol, mas pouco aquece. Há uma tenda de campismo que mal se aguenta contra a força do vento e um tractor novo para levar a choupana quando mudarem de poiso. Read more →
lá em cima
Três semanas depois da subida, fomos ver os pastores à hora do descanso depois de uma noite de temporal, em boa parte passada a reunir as ovelhas espantadas pelos trovões. O contraste entre a ideia de uma rotina facilitada pela existência de carros e telemóveis e a realidade do andar madrugada fora à s escuras com a roupa gelada encostada à pele faz-nos perceber que a vida do pastor não é de facto assim muito diferente da que levou o seu avô. Read more →
wip hairport
Onde eu corto o cabelo há mais de dez anos, onde a E. corta há mais de três e onde a A. se estreou hoje antes que o cabelo lhe chegasse à s pernas. Vivam as mãos sábias da Sabine. Se forem ter com ela, digam que vão da minha parte. Read more →
cowork lisboa
Se eu não estivesse tão bem instalada na Rua do Loreto, se o meu trabalho implicasse estar mais tempo sentada à secretária, se estivesse a escrever uma tese, se passasse demasiado tempo em casa ou tivesse gente de menos à volta mudava-me já para a Cowork Lisboa na Lx Factory. Read more →
tu podes, assim tu queiras
Uma espécie de Keep calm and carry on à portuguesa, numa pequena gravura popular encontrada hoje por acaso ao folhear mais uma vez a minha revista extinta preferida (Terra Portuguesa, dirigida por VergÃlio Correia e Sebastião Pessanha nos inÃcios do século XX). Vou adoptar.
☠☠☠â˜
As belas mantas. Chegou ao fim mais um mês de mantas de retalhos aos quadrados, feitas pela Rita, pela Inez e pela Ana Rita. Tão diferentes entre elas como das dos cursos anteriores ( ☠e ☠), todas – digo eu que sou suspeita – a merecerem rasgados elogios. Em Setembro há mais. Read more →
o alfaiate
Fomos à procura do alfaiate que fez os casacos dos pastores porque, depois de experimentar o do Pedro, decidi mandar fazer um à minha medida. A morada que tÃnhamos era o nome da aldeia, Folhadosa. Encontrámo-lo a trabalhar no seu atelier, por detrás de uma porta pequenina, numa quelha da largura de um corredor: António José (“Tozé” no cartão de visita), alfaiate diplomado, com tanto trabalho em mãos que só no Outono terei a minha encomenda pronta. Mas na visita não resisti a um colete em burel e riscado com estrelas recortadas… Read more →
dos bodes
Há vários meses, ao ler sobre a Serra de Montemuro, aprendi que os bodes vindos na transumância da Serra da Estrela traziam nessa ocasião os chifres enfeitados com fitas e pompons. Os que acompanhámos não levavam os enfeites, mas pelo menos um tinha os chifres cheios dos furinhos necessários para os segurar, e disse-me o João que na casa do seu pai ainda estariam uns, feitos no tempo da sua avó ou antes disso. Lá os fomos ver, claro.
Em conversa com uma senhora da Serra de Montemuro, uns dias depois, fiquei a saber que era hábito irem os das aldeias dessa região esperar a Castro Daire pelos rebanhos da Serra da Estrela, e receber os pastores com pão e vinho. A chegada dos animais, com estes enfeites e com os grandes chocalhos, devia ser um momento impressionante. Read more →
a transumância iv
Iam vestidos a preceito, e não era por nossa causa. Só o maioral e o Pedro levavam o colete e a camisola de xadrês debruado a burel recortado, mas quase todos nos impressionaram pelo inesperado aprumo. Colete de lã feito no alfaiate (tema para outro post), chapéu de feltro (de coelho para os mais velhos, de lã para os mais novos) de aba curta e revirada e copa baixa moldada pelos dedos para formar um bico nos dias de chuva por onde a água escorre mais facilmente (só as maneiras de o pôr mais para a frente ou para trás dariam matéria para umas páginas…) e o indispensável cajado, de pau de marmeleiro ou de outra madeira que não apontei (Diane, lembras-te?), uma melhor para o tempo seco e outra para o inverno, bordado no topo à navalha por quem sabe. O cajado apoia a marcha, afasta o mato, manda parar e mudar de sentido, caleja a palma do pastor e à s vezes voa para chamar o bicho que saiu do caminho. Read more →
a transumância iii
São elas as grandes protagonistas da viagem. Sobe-se a montanha porque as pastagens das zonas mais baixas já não têm alimento que chegue, e porque estes animais continuam a comer pasto e não ração. Se alguns pastores (que aqui quer dizer proprietários de ovelhas) alugam no verão pastagens próximas para as duas chegadelas (refeições) diárias do seu rebanho, outros mantêm o hábito ancestral de o levar para outras paragens, ou de o entregar a quem o leve, pagando uma quantia certa por cabeça. O rebanho que acompanhámos era composto por vários rebanhos de média dimensão pertencentes a outros tantos pastores. Na liderança seguia o maioral (pastor responsável por toda a operação), acompanhado pelos pastores mais velhos, e atrás os mais novos e os empregados (pastores sem rebanho). Cada animal traz nas costas a marca do seu dono, o que permitirá apartá-lo depois do regresso e, ao pescoço, a sonora loiça que nesta ocasião especial é maior do que a usada habitualmente. Os chocalhos maiores, mesmo novos, valem várias centenas de euros e vêm actualmente do Alentejo, onde continuam a ser feitos individualmente, à mão. Read more →