a transumância iii

ovelha

bode

São elas as grandes protagonistas da viagem. Sobe-se a montanha porque as pastagens das zonas mais baixas já não têm alimento que chegue, e porque estes animais continuam a comer pasto e não ração. Se alguns pastores (que aqui quer dizer proprietários de ovelhas) alugam no verão pastagens próximas para as duas chegadelas (refeições) diárias do seu rebanho, outros mantêm o hábito ancestral de o levar para outras paragens, ou de o entregar a quem o leve, pagando uma quantia certa por cabeça. O rebanho que acompanhámos era composto por vários rebanhos de média dimensão pertencentes a outros tantos pastores. Na liderança seguia o maioral (pastor responsável por toda a operação), acompanhado pelos pastores mais velhos, e atrás os mais novos e os empregados (pastores sem rebanho). Cada animal traz nas costas a marca do seu dono, o que permitirá apartá-lo depois do regresso e, ao pescoço, a sonora loiça que nesta ocasião especial é maior do que a usada habitualmente. Os chocalhos maiores, mesmo novos, valem várias centenas de euros e vêm actualmente do Alentejo, onde continuam a ser feitos individualmente, à  mão.

marca

No rebanho há alguns carneiros, cabras e bodes, mas são as ovelhas que estão em larga maioria. Percorrer quilómetros de serra junto delas, por vezes no meio delas, sentindo-lhes as cabeças sempre baixas a empurrar-nos mansamente as pernas, abrir-lhes caminho por entre as giestas mais serradas, fazer literalmente parte do rebanho é uma experiência extraordinária. É fácil dizer que se preferem as cabras, enérgicas e fotogénicas, mas há qualquer coisa especial nestes bichos dóceis, e não é só a . Diz quem não as conhece que são burras, diz o pastor que em certas atitudes que tomam mostram mais raciocínio que muita gente.

subir

A subida cansa os animais como a gente, e perto do fim já são notórias a sua expressão exausta, a sede e a fome que as ervas do caminho não saciaram. A recompensa é a chegada ao ponto planeado para o descanso da tarde, onde há água e alimento com fartura. Os cães entram no rio para refrescar e a gente deita-se à  sombra das árvores. Como nas histórias.

parto

Comments

11 responses to “a transumância iii”

  1. Ana Lacunza Avatar
    Ana Lacunza

    Olá, Rosa. Chorei quando li o texto acima. Já fui pastora por um tempo e sinto muita saudade das ovelhas, de estar no meio delas, cuidar delas… Adorei ver a transumância. Já tinha ouvido falar, mas não sabia o que era. Parabéns! Também gosto muito de tudo que se refere a lã: desde a criação até o tricot.
    Abraço com meus votos que Portugal não perca as tradições.
    Ana

  2. Luisa Avatar
    Luisa

    A 2nda cabra(ou bode)? faz-me lembrar alguem, nao me lembro quem…
    O meu marido, quando era estudante de agronomia foi ajudante de pastor em Kent.
    Pelo q me disse nao parece ter sido uma experiencia tao romantica como esta-ele ajudava durante a lambing season-quando nascem os cordeirinhos -e alem de ser cansativo nao era sempre muito agradavel.Mas acho q ele ate tinha geito!

  3. Daniela Avatar

    Numa das aldeias daqui, Gralhas, fazem a vezeira das ovelhas e cabras. Nada tão épico como a transumância. Vão e voltam no mesmo dia. Antes, reuniam-se os rebanhos ao som do sino. Depois, foi a buzina. Agora, constou-me, mas ainda não pude confirmar, que se algum dos donos dos animais se atrasa antes da reunião pela manhã no largo da aldeia, o pastor daquele dia usa o telemóvel :)

  4. Silvia McFarland Avatar

    Gostei muito de ler sobre os pastores. Lembro-me de os ver com os rebanhos perto de Arganil quando iamos de visita a casa dos meus avos.

  5. Cristina Avatar

    Uma das mais bonitas e interessantes série de posts que tive oportunidade de ler, com fotografias que são verdadeiros quadros. Obrigada pela partilha.

  6. Elsa Jacinto Avatar
    Elsa Jacinto

    São lindas!

  7. calita Avatar

    Isto – a transumância, as fotos, os textos – é absolutamente maravilhoso!

  8. […] da Serra da Estrela traziam nessa ocasião os chifres enfeitados com fitas e pompons. Os que acompanhámos não levavam os enfeites, mas pelo menos um tinha os chifres cheios dos furinhos necessários para […]

  9. […] as crianças mais pequenas, que fazem a sesta abrigadas pelas pedras. Entregamos fotografias da subida, que nos ganham a estima das mulheres. Come-se um bolinho, melhor ainda com uma fatia de queijo da […]

  10. […] esfoliada na fábrica para parecer o que não é. Veio aqui mesmo da Serra da Estrela, das ovelhas Bordaleiras que levam boa vida junto aos seus […]

  11. Ana Maria Avatar
    Ana Maria

    A Transumância ainda vive e é linda, mas já não percorre caminhos de outros tempos, como quando se deslocava para a serra de Montemuro, atravessando uma série de vilas e aldeias, com os rebanhos cheios de cor e som. Tudo era festa! Gostei muito deste post.

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