São elas as grandes protagonistas da viagem. Sobe-se a montanha porque as pastagens das zonas mais baixas já não têm alimento que chegue, e porque estes animais continuam a comer pasto e não ração. Se alguns pastores (que aqui quer dizer proprietários de ovelhas) alugam no verão pastagens próximas para as duas chegadelas (refeições) diárias do seu rebanho, outros mantêm o hábito ancestral de o levar para outras paragens, ou de o entregar a quem o leve, pagando uma quantia certa por cabeça. O rebanho que acompanhámos era composto por vários rebanhos de média dimensão pertencentes a outros tantos pastores. Na liderança seguia o maioral (pastor responsável por toda a operação), acompanhado pelos pastores mais velhos, e atrás os mais novos e os empregados (pastores sem rebanho). Cada animal traz nas costas a marca do seu dono, o que permitirá apartá-lo depois do regresso e, ao pescoço, a sonora loiça que nesta ocasião especial é maior do que a usada habitualmente. Os chocalhos maiores, mesmo novos, valem várias centenas de euros e vêm actualmente do Alentejo, onde continuam a ser feitos individualmente, à mão.
No rebanho há alguns carneiros, cabras e bodes, mas são as ovelhas que estão em larga maioria. Percorrer quilómetros de serra junto delas, por vezes no meio delas, sentindo-lhes as cabeças sempre baixas a empurrar-nos mansamente as pernas, abrir-lhes caminho por entre as giestas mais serradas, fazer literalmente parte do rebanho é uma experiência extraordinária. É fácil dizer que se preferem as cabras, enérgicas e fotogénicas, mas há qualquer coisa especial nestes bichos dóceis, e não é só a lã. Diz quem não as conhece que são burras, diz o pastor que em certas atitudes que tomam mostram mais raciocínio que muita gente.
A subida cansa os animais como a gente, e perto do fim já são notórias a sua expressão exausta, a sede e a fome que as ervas do caminho não saciaram. A recompensa é a chegada ao ponto planeado para o descanso da tarde, onde há água e alimento com fartura. Os cães entram no rio para refrescar e a gente deita-se à sombra das árvores. Como nas histórias.
Olá, Rosa. Chorei quando li o texto acima. Já fui pastora por um tempo e sinto muita saudade das ovelhas, de estar no meio delas, cuidar delas… Adorei ver a transumância. Já tinha ouvido falar, mas não sabia o que era. Parabéns! Também gosto muito de tudo que se refere a lã: desde a criação até o tricot.
Abraço com meus votos que Portugal não perca as tradições.
Ana
A 2nda cabra(ou bode)? faz-me lembrar alguem, nao me lembro quem…
O meu marido, quando era estudante de agronomia foi ajudante de pastor em Kent.
Pelo q me disse nao parece ter sido uma experiencia tao romantica como esta-ele ajudava durante a lambing season-quando nascem os cordeirinhos -e alem de ser cansativo nao era sempre muito agradavel.Mas acho q ele ate tinha geito!
Numa das aldeias daqui, Gralhas, fazem a vezeira das ovelhas e cabras. Nada tão épico como a transumância. Vão e voltam no mesmo dia. Antes, reuniam-se os rebanhos ao som do sino. Depois, foi a buzina. Agora, constou-me, mas ainda não pude confirmar, que se algum dos donos dos animais se atrasa antes da reunião pela manhã no largo da aldeia, o pastor daquele dia usa o telemóvel :)
Gostei muito de ler sobre os pastores. Lembro-me de os ver com os rebanhos perto de Arganil quando iamos de visita a casa dos meus avos.
Uma das mais bonitas e interessantes série de posts que tive oportunidade de ler, com fotografias que são verdadeiros quadros. Obrigada pela partilha.
São lindas!
Isto – a transumância, as fotos, os textos – é absolutamente maravilhoso!
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A Transumância ainda vive e é linda, mas já não percorre caminhos de outros tempos, como quando se deslocava para a serra de Montemuro, atravessando uma série de vilas e aldeias, com os rebanhos cheios de cor e som. Tudo era festa! Gostei muito deste post.