a lã

ver fiar

Junto a Miranda do Douro, pela mão de uma bela gaiteira, cheguei a casa da Ti Paula. Com elas passei uma manhã inesquecível, enquanto a E. e a A. corriam atrás dos gatos e dos pintos. Ganhei uma mestra sem estudos (disse ela), aprendi mais sobre as malhas que lá me levaram, vi fazer um manelo a preceito e fiei na roca uns metros de lã que ainda hão de ser tecidos. O manelo é a porção de lã que se prende na roca para fiar, e foi assim que a Ti Paula o preparou:

o manelo 1

A lã já lavada (das ovelhas da raça mirandesa, cujas fibras são muito longas) é cuidadosamente aberta à  mão e arrumada num montinho em que as fibras se encontram alinhadas quase todas na mesma direcção. Esta porção de lã é enrolada rapidamente com as mãos, ficando com uma forma vagamente cilíndrica.

o manelo 2

o manelo 3

o manelo 4

Desta lã começam-se a puxar suavemente as fibras, num gesto repetido e certeiro, criando um longo feixe de espessura bastante regular.

o manelo 5

Este feixe é depois separado em porções com cerca de dois palmos de comprimento. As fibras estão agora muito alinhadas, com um aspecto penteado.

o manelo 6

o manelo pronto

Num gesto de poucos segundos, o manelo é enrolado num cilindro, e está pronto para ir para a roca, que se prende à  cintura.

o manelo

A correia prende o centro do manelo ao roquil (parte bojuda da roca). Fica a roca pronta para a função.

começar

A roca fica colocada entre o braço esquerdo e o tronco, semi-apoiada no antebraço. As fibras são puxadas e torcidas para criar uma primeira porção de fio que se possa prender ao fuso para começar a fiar. Aqui os fusos são altos e têm sempre volante (um disco encaixado junto à  base da haste, como nos fusos pré-históricos), e são em geral de freixo, mas também podem ser de espinheiro ou buxo.

fia

Com o braço esquerdo sempre por baixo do cabo da roca, começa a fazer-se a maçaroca (a porção de fio que enche o fuso), nos dois movimentos cíclicos que compõem a fiação: puxar e torcer as fibras criando o fio…

fiar

…e enrolar o fio em torno do fuso.

aprendiza
(Oubrigada Suzana pulo retrato!)

(Do Verão passado: fiar em Peroselo com a D. Laudecena.)

Comments

10 responses to “ti paula”

  1. Catarina Avatar

    Buona nuite Rosa, oubrigada!

  2. nanouke Avatar

    Estou tão invejosa neste momento…
    Obrigada pela partilha Rosa!

  3. Andreia Avatar

    Genuíno!

    Que bom existir alguém a documentar assim estes saberes. Obrigada Rosa!

  4. esther Avatar

    E isa é xa a lá coa que se traballa? xa diretamente pode ir as agullas?

    Valoro moito o seu traballo, Rosa, ese afan do tirar do fío, (nunca mellor dito) para saber de onde veà±en as cousas… penso que esa é o correto e verdadeiro enfoque da sustentabilidade.

  5. chiara Avatar

    This is very interesting and most precious, thanks

  6. Francesca Avatar

    Trying to leave a comment again – I don’t know what happened to the other one!
    As far as I understand, what you describe is the method I was told to use. However, when I gently pull the raw fibers out from the bundle, I never ever get an even strand.
    I see that you’re using a drop spindle there, how does it compare to the French spindle?
    Ciao!
    PS – would you consider stocking your shop with those neat carding tools? I NEED one :)

  7. Rosa Pomar Avatar

    Francesca, it looks like a drop spindle but it is never actually dropped, it works just like a french spindle.

  8. Andrea Lima Avatar

    lindo demais, Rosa! obrigada pelo caminho que você tem traçado pelos saberes portugueses, e por dividir tudo tà¤o lindamente. Uma dúvida minha, a palavra “tagra” lhe diz alguma coisa? Venho buscando o significado pra essa palavra há anos, os dicionários brasileiros nà¤o a apresentam, achei uma vez em um dicionário português muito antigo em uma biblioteca, e sei que vem do universo camponês, mas perdi a referência e nà¤o estou bem certa mais do significado. se soubesse, agradeceria :)

  9. […] depois), nem se usa roca (tal como na Serra de Montemuro). O fuso é semelhante aos que se usam em Trás-os-Montes (de tipo 1 na tabela estabelecida por Benjamim Pereira), mas aqui a roda (volante) tem um diâmetro […]

  10. […] ser só em recriações folclóricas ou para turista ver: Duas Igrejas, junto a Miranda do Douro. A Ti Paula vai ser uma das várias mestras e eu vou sobretudo contextualizar e ajudar com base na minha […]

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